O Sombra - A Trajetória de um Personagem


O Sombra (The Shadow) foi um personagem criado na década de 1930 que conseguiu atravessar as décadas, foi fonte de inspiração para o gênero dos super-heróis (o Batman que o diga) e adaptado para diversas mídias tendo até hoje certa relevância na cultura pop. O personagem continua sendo publicado e vez ou outras estrela crossover com outros personagens.

Como Surgiu O Sombra
A história de nosso personagem começa com a editora de revistas pulp (quer saber tudo sobre os pulps leia o texto do Gian Danto aqui) chamada Street & Smith. Esta empresa publicava o título Detective Story Magazine, revista que  trazia histórias de detetives. Para alavancar suas vendas, a editora contratou David Chrisman e William Sweets para adaptar as principais histórias da revista para um programa de rádio.


Chrisman e Sweets tiveram a ideia colocar um narrador misterioso com uma voz sinistra para comandar o programa, então eles começaram a procurar um nome adequado. O roteirista Harry Engman Charlot sugeriu "O inspetor" ou "O detetive" até que surgiu "O Sombra". O programa foi batizado de Detective Story Hour e estreou em 31 de julho de 1930 (lembrando que na década de 1930 os EUA estava vivendo a Era de Ouro das Rádios). O Sombra estreou nas rádios narrando contos de mistério e suspense tirados da Detective History. Inicialmente O Sombra foi interpretado por James LaCurto e substituído após alguns meses por Frank Readick Jr. O programa fez muito sucesso, tanto que ao irem às bancas de jornal as pessoas não procuravam a Detective Story, eles queriam histórias d'O Sombra.

Fotografia promocional para The Detective Story Hour, com James La Curto como O Sombra (1930).

O Sombra começa a sair nas Revistas Pulps
Vendo o sucesso do Sombra, a Street & Smith chama Walter Gibson para escrever as histórias do personagem, que assinou essas histórias com o pseudônimo de Maxwell Grant. Em 1 de Abril de 1931 sai a The Shadow Magazine. Gibson escreveu 282 de 325 contos, em 20 anos em que a revista foi publicada.
Com o personagem, Gibson montou as bases do que viria a ser usado mais tarde nas histórias em quadrinhos de super-heróis, pois o Sombra tinha uma identidade secreta, tinha assistentes, combatia o crime a noite aterrorizando os criminoso usando um traje preto com um lenço vermelho cobrindo seu parte de seu rosto e uma galeria de vilões excêntricos.
Nos anos que se seguiram o volume da produção aumentou bastante e muitos autores escreveram histórias do Sombra. As publicações foram até 1949.
O sucesso dessas histórias fez o personagem ganhar um programa de rádio só seu, que de 1937 a 1938 foi interpretado por Orson Wells, esse que hoje é conhecido como um dos maiores diretores de cinema de todos os tempos. Neste programa, o slogan “Quem sabe o mal que se esconde nos corações dos homens? O Sombra sabe!” tornou-se parte da cultura pop americana.

Orson Wells interpretando O Sombra

Quem é O Sombra?
Nas primeiras aventuras na década de 1930, seu nome verdadeiro é Kent Allard, um piloto francês da Primeira Guerra Mundial que forja sua própria morte e viaja pelo mundo em busca de autoconhecimento e de aventuras, incluindo o Tibete, onde aprende a arte do hipnotismo.
De volta aos EUA, Allard se depara com um país decadente e começa sua própria guerra contra o crime, adotando uma série de identidades secretas para atingir seus objetivos. Uma de suas identidades mais famosas, e uma das mais usadas nos quadrinhos, é a do playboy milionário (onde será que eu já vi isso?) Lamont Cranston. Nos pulps, o Sombra usa frequentemente a identidade de Cranston enquanto o milionário está fora da cidade até que ambos se encontram e o Sombra convence Cranston a ajuda-lo na luta contra o crime. Esta identidade foi adotada como única nos programas de rádio do personagem, como facilidade de roteiro, e acabou sendo a adotada em diversas encarnações do herói nos quadrinhos.
Com sua base estabelecida em Nova York, o herói começa a montar uma rede de associados formada por diversas pessoas de quem salvou a vida, todos reconhecíveis pelo anel similar ao usado pelo próprio Sombra. Os mais conhecidos são Moses “Moe” Shrevnitz, um taxista que serve como seu motorista particular, e Margo Lane, uma socialite que apareceu pela primeira vez no programa de rádio e posteriormente foi levada para os pulps. Margo muitas vezes foi utilizada como par romântico do personagem.

Nos quadrinhos
Sua primeira aparição se deu em 1940, também pelas mãos de Walter Gibson, em tiras diárias de jornal que adaptaram as histórias dos pulps. A arte era de Vernon Greene, e as tiras foram canceladas em 1942.


A Street & Smith, entretanto publicou 101 edições da revista Shadow Comics, entre 1940 e 1949, e durante os anos 50 o personagem apareceu em algumas edições da revista Mad.


Nos anos 60, a Archie Comics publicou uma minissérie em oito partes (1964-1965), que possui roteiros de Jerry Siegel, criador do Superman. Sua fase mais lembrada veio então nos anos 70, mais especificamente em 1973, com a série em doze edições publicada pela DC Comics com roteiros de Dennis O’Neil e arte de Michael Kaluta, Frank Robbins e E. R. Cruz. O personagem apareceu nas revistas do Batman (#253 e #259), referenciado pelo Homem-Morcego como “uma grande inspiração“, além de ser mencionado também em Detective Comics #446. Nesta fase, as histórias do Sombra estavam situadas nos anos 30, na Terra Um do Multiverso da DC, e o personagem lidava com criminosos e experimentos bizarros, característica típica dos heróis pulp.


Em 1986, a minissérie em quatro edições escrita e ilustrada por Howard Chaykin trouxe O Sombra para a modernidade, em Nova York, e atualizou seus equipamentos, quando passou a utilizar metralhadoras Uzi e lançadores de mísseis. Muito humor ácido e violência foram utilizados, entretanto a minissérie Sangue & Sentença foi um grande sucesso, que motivou a DC Comics a dar continuidade com uma série mensal iniciada em 1987.


A série foi continuada por Andy Helfer (que editou a série de Chaykin) e ilustrada por Bill Sienkiewicz (edições #1 a #6) e Kyle Baker (#8 a #19 e dois Anuais), com a sétima edição ilustrada por Marshall Rogers. O Sombra lida com cultos religiosos, inimigos corporativos e a corrupção que toma conta da cidade. 


Em 1988, O’Neil e Kaluta produziram uma graphic novel da Marvel Comics situada na Segunda Guerra Mundial, e no mesmo ano a Malibu Comics deu início à republicação das clássicas tiras de jornal.



Entre 1989 e 1992 a DC Comics publicou uma nova série do Sombra, The Shadow Strikes, com roteiros de Gerard Jones e arte de Eduardo Barreto. A revista trouxe o personagem de volta às origens pulp, com aventuras situadas em 1930, e mostrou seu primeiro team-up com Doc Savage, outro clássico personagem dos pulps. A série foi concluída com 31 edições e um Anual e tornou-se a maior revista do personagem, em duração, desde as tiras de 1940.


Os direitos então partiram para a Dark Horse Comics, que publicou algumas minisséries entre os anos de 1993 e 1995, com roteiros de Joel Goss e Michael Kaluta e arte de Gary Gianni, além de Steve Vance com Stan Manoukian e Vince Roucher. A editora também publicou alguns one-shots e adaptou o filme de 1994 para quadrinhos, com duas revistas feitas por Goss e Kaluta. Em 1995, o crossover de Ghost com O Sombra também foi publicado, com textos de Doug Moench e arte de H. M. Baker e Bernard Kolle.
Após mais republicações das tiras de jornal por editoras diversas durante o final dos anos 90 e começo dos anos 2000, em 2011 a Dynamite Entertainment licenciou o personagem para novas revistas e minisséries. O primeiro arco da série mensal foi publicado em 2012, escrito pelo superstar Garth Ennis com arte de Aaron Campbell, e a revista seguiu com outras equipes criativas até a edição #26, com a editora publicando neste período algumas minisséries e especiais como Máscaras (que mostra O Sombra encontrando outros personagens pulp como o Zorro, Besouro Verde e O Aranha), O Sombra/Besouro Verde: Cavaleiros das Trevas, O Sombra: Ano Um e o crossover com Grendel, personagem de Matt Wagner publicado pela Dark Horse. Em 2015 a editora deu início ao segundo volume da série mensal do personagem, além de ter republicado as séries da DC e Marvel citadas anteriormente.



Adaptações para as Telas
A primeira “aparição” do personagem no cinema se deu em uma série de curtas produzidos pela Universal Pictures entre 1931 e 1932, baseados em histórias do programa Detective Story Hour. Alguns destes curtas traziam a narração em off do Sombra, assim como os originais do rádio. Em 1937, o herói chegou ao cinema interpretado por Rod La Rocque no filme The Shadow Strikes, cuja continuação, International Crime, chegou aos cinemas em 1938. Apesar do visual um pouco diferente daquele eternizado nas capas das pulps, os filmes são bem interessantes, com uma pegada noir detetivesca divertida.
Em 1940, o Sombra estreou um seriado de 15 capítulos produzidos pela Columbia com Victor Jory no papel principal. O visual do herói é mais parecido com aquele que conhecemos hoje, mas muito aquém da figura marcante do personagem. Em 1946, a Monogram Pictures produziu um filme de baixo orçamento com Kane Richmond como o Sombra intitulado The Shadow Returns, com o herói usando uma máscara cobrindo todo o seu rosto, ao invés do lenço vermelho.
O Sombra ainda teve duas tentativas de ser levado para a TV, a primeira em 1954, em The Shadow, com Tom Helmore na pele do personagem e, em 1958, o herói ganhou um piloto de seriado que não deu certo e acabou nomeado como Invisible Avenger. O filme foi reeditado e lançado em 1962 como Bourbon Street Shadows.
Foi apenas em 1994, devido ao sucesso dos filmes do Batman dirigidos por Tim Burton, que o Sombra ganhou sua melhor adaptação para as telonas. O filme, intitulado apenas de O Sombra, foi produzido pela Universal Pictures e dirigido por Russel Mulcahy, diretor australiano que já havia trabalhado em Highlander – O Guerreiro Imortal. No papel principal, Alec Baldwin interpreta o melhor Sombra dos cinemas, que era visualmente impecável, principalmente devido à maquiagem que destacava seu nariz e o olhar insano do Sombra. O roteiro de David Koepp, dos primeiros Jurassic Park, faz um bom trabalho apresentando a origem do personagem, que está toda ali, apesar de algumas adaptações, e todo o universo do herói, inclusive trazendo o elenco de personagens coadjuvantes famosos como Margo Lane, interpretada por Penélope Ann Miller, e Moe Shrevnitz, interpretado por Peter Boyle. Mesmo assim, o tom mais leve e o forte cunho sobrenatural usado no filme desagradou os fãs do Sombra, que esperavam algo mais soturno e violento.


O Sombra foi planejado como uma grande franquia e preparado para ser o grande blockbuster de verão no ano do seu lançamento. Com um orçamento de 40 milhões de dólares, o filme rendeu apenas 48, sendo considerado um fracasso para os padrões da indústria. A linha de brinquedos do Sombra produzida pela Kenner como parte importante do merchandising do filme é considerada por muitos até hoje um dos maiores flops da indústria de brinquedos.


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